21 maio 2007

TRONCAS – É DO 01 DA BATALHA?...

Correspondendo aos desafios lançados pelas “malvadas” das nossas amigas "PAPOILA" e "MARIA CARVALHOSA" dedico esta história a todos os jovens que nasceram depois de 1970, e também aos outros jovens mais antigos, que tal como eu, viveram estas andanças.

Naquele tempo “A TERRA AINDA NÃO ERA REDONDA” pelo menos não parecia.

Habituados aos telemóveis e à Internet, onde ao alcance de um “klic”, hoje, podemos ver, ouvir e falar em tempo real, com outras pessoas colocadas no outro lado do Mundo ou até mesmo no espaço; não será fácil para os jovens de agora, imaginar a dificuldade de efectuar actos tão simples, como telefonar, mesmo que fosse apenas de Lisboa para Leiria ou de Chaves para o Porto, pelo menos até ao início da década de sessenta.

Ao relembrar estes tempos, nem melhores, nem piores, apenas diferentes; espero proporcionar-lhes um momento hilariante, com factos que podem confirmar junto dos vossos pais e avós, e que podem servir como divertido tema de conversa, quando momentaneamente estiverem sem acesso à Internet.






Central Telefónica (Troncas)
Fotografia roubada na net





TRONCAS – É DO 01 DA BATALHA?...

DEZ HORAS DA MANHÃ

Troncas, troncas… para onde deseja falar?... perguntava a telefonista, sentada ao PBX de onde pendiam inúmeras cavilhas destinadas a fazer as ligações entre as diferentes linhas telefónicas.

Pormenor de um aparelho de PBX
Outra fotografia, "gentilmente" roubada na net


Do outro lado do fio alguém respondia:

– Olhe minha senhora, eu queria falar para o 01 da Batalha, por favor.

Telefonista - De que número fala?

- Daqui fala de Lisboa é o número 4024.

- Um momento vou fazer a ligação. Desligue que eu já chamo.

E com isto já tinham passado os primeiros cinco minutos.
Algum tempo depois, cerca de quinze ou vinte minutos, lá tocava o telefone.

- Está lá… é do 4024 de Lisboa?... foi o senhor que pediu o 01 da Batalha?... pode falar está em comunicação.

Ao fim da primeira meia hora, no mínimo, lá começava a conversa com o destinatário.

01 da Batalha - Telefone do café do Senhor Florindo


- Está é do café Primavera?...
- É sim. Quem fala?...
- Fala Mariana Azevedo. O Senhor Florindo está?... depressa, estou a falar de Lisboa…
- Sou eu próprio. D.ª Mariana como está?… e o menino?…

Nesta altura acabavam-se as presas; eram pessoas conhecidas e havia que tagarelar os repetidos cumprimentos e saber do estado de saúde de todos. Por fim entrava novamente a telefonista na linha, para informar o tempo da comunicação que era paga em períodos de 3 minutos.

Telefonista - Vossa excelência está em comunicação?... Três minutos - deseja continuar?...

- Desejo sim, minha senhora.

- Olhe senhor Florindo, eu queria falar com a Maria do Rosário, na casa do José Pedro… se o senhor fizesse o favor?...

- Pois não D.ª Mariana, com todo o gosto, mas agora não tenho cá o rapaz, que foi almoçar. Logo que ele chegue mando-o lá avisar. Pode telefonar ás quatro?... (da tarde)

- Muito obrigado senhor Florindo, é muito simpático da sua parte, eu telefono ás quatro.

Com isto tudo já passava do meio dia.

“Moderníssimo” telefone de casa da D.ª Mariana em Lisboa
Contemporâneo do outro, mas era um telefone de Lisboa…




DUAS HORAS DA TARDE

Maria do Rosário tinha que regar a horta; um pouco mais logo, pela fresca.

Com este calor as couves estavam murchas e logo este contratempo; os arames que prendiam o balde de madeira ao braço da picota, tinham-se partido.
Felizmente tinha conseguido tirar o balde do fundo do poço.

Picota, engenho para tirar água dos poços



Ai o meu Zé é que devia tratar disto, pensava Maria do Rosário, mas ele chegava a casa tão cansado que ela nem lhe falava nestas coisas. Talvez no Domingo?!...

Subitamente um rapazito de bicicleta, ofegante por ter pedalado estrada acima os dois ou três quilómetros que separavam o café do Florindo da casa da Rosário, irrompia quintal a dentro:

- Ó senhora Rosário (gritava) tem um telefonema para si lá no café do meu patrão. Olhe que é de Lisboa. Voltam a falar ás quatro da tarde!

Tão rápido quanto despejava o recado, lá abalava estrada fora a toda a velocidade, pois que agora o caminho era a descer.

Ai um telefonema de Lisboa!?... será que aconteceu alguma coisa à minha irmã?... pensava a pobre mulher com o coração aos saltos no peito.

Já devem ser três horas… pareceu-me já ter ouvido o sino da capelinha dar as badaladas?... das duas já passa, que eu bem ouvi o apito da fábrica… o melhor é ir andando.

Maria do Rosário, lavou os pés na água fresca do tanque e calçou as chinelas, tirou o avental e com um xale pela cabeça para se proteger, abalou estrada fora debaixo do sol impiedoso das três da tarde.

Uma chamada de Lisboa… a minha irmã… talvez que seja ela para me dizer que vem passar a Páscoa… é isso… deve querer dizer que chega amanhã na carreira dos Claras, pelas seis da tarde. Deve ser isso!?

A carreira de autocarros dos Claras, ao tempo saia de Lisboa, penso que da avenida Almirante Reis e ia até Leiria.

Um percurso que hoje se faz em cerca de duas horas, naquele tempo era um dia quase todo.

Moderníssimo” autocarro de carreira finais dos anos cinquenta



As carreira dos "Claras" e dos "Capristanos", paravam em todos os lados. Lisboa, Malveira, Torres Vedras, Bombarral, Caldas da Rainha, S. Martinho do Porto, Nazaré, Alcobaça, finalmente na casa de Maria do Rosário, Batalha e Leiria. Mais tarde, quando oportuno, falar-vos-ei disto.

QUATRO DA TARDE

Novamente toca o telefone:

- Está é do 4024 de Lisboa?... Foi o senhor que pediu o 01 da Batalha?... fale que está a responder….

Pois é queridos meninos, depois disto ainda reclamam que a “net” hoje está muito lenta?... (três minutos desejam continuar?...)

Para nós isto era o progresso. Falar de Lisboa para Leiria em apenas uma ou duas horas… uma maravilha. Não tínhamos nada mais rápido. Isto, claro está se alguns de nós tivessemos telefone, coisa que a maior parte das pessoas não tinham.

NOTA DO AUTOR:

Na impossibilidade de agradecer aos donos – INFORMO
Todas, mas todas, as fotografias apresentadas neste texto, foram gentilmente roubadas na “NET”, mas roubadas com elegância. O chamado “crime de colarinho branco”.

13 Comments:

At 21 maio, 2007 19:41, Blogger redonda said...

Achei o máximo a história :)
É mesmo para aprender a não reclamar quando a net parece lenta :)

 
At 22 maio, 2007 02:07, Blogger APC said...

Pois... Isto evoluiu que foi um pulinho! Mas de um telefone como o da D. Mariana, ainda liguei. Só que já havia outros, pois...

O texto, esse está uma delícia e fazia falta! Muito bem narrado, ilustra na perfeição uma realidade que é, como dizes, impensável para os jovens nascidos pós setenta.

E a moral da história fez-se sentir! :-)

Abraço.

 
At 22 maio, 2007 10:26, Blogger Papoila said...

Besnico:
Deliciei-me com a história com a telefonista a avisar os três minutos... Uma delícia de "progresso"... Aguardo a história da viagem de camioneta... Lembrei-me do Douro de Tabuadelo da quinta do meu avô e claro dos telefones a que se dava à manivela... ainda nos anos setenta...
Beijos

 
At 22 maio, 2007 11:30, Blogger Maria Carvalho said...

Verdade! Lembro-me bem desses tempos. Em casa do meu bisavô exista um telefone de pé alto como o da foto! Adorei ler-te. Beijos.

 
At 22 maio, 2007 11:47, Blogger mafalda said...

Olá Besnico di Roma,

Ainda não tinha visitado o seu espaço mas dei por muito bem empregue a minha vinda até aqui. Que estórias divertidas! Dá gosto ler quem escreve com o humor na ponta dos dedos.

Aproveito para lhe deixar um convite para me visitar na minha casa, recém-construída: Vento Agreste.

Um beijinho.

 
At 22 maio, 2007 14:43, Blogger Flôr said...

São sempre deliciosas as tuas estórias.

É engraçado como antigamente, o tempo, demorava tanto tempo!!!....

Beijinho

 
At 22 maio, 2007 16:09, Anonymous Anónimo said...

Ó amigo Bésnico, quando cheguei á Marinha Grande em meados dos anos oitenta, nas fábricas da Ivima e do “manel Pereira” o sistema eram os PBX, assim como na fábrica de cimentos da Maceira e Pataias, sabe, eu fiz a pé por várias vezes o percurso entre S. Pedro e Água de Medeiros quando chovia, o restaurante Gato Preto tinha telefone com uma ligação a fios nus em cobre, com isoladores em postes de sete metros com muitos anos á beira da estrada, sempre que havia trovoada junto do mar o telefone do parque de campismo Batista estoirava, nunca identificamos o fenómeno.

Já me passou pela cabeça, que alguma vez estive em sua casa, para reparar o telefone.

Um abraço…

 
At 22 maio, 2007 16:10, Anonymous Anónimo said...

Ó amigo Bésnico, quando cheguei á Marinha Grande em meados dos anos oitenta, nas fábricas da Ivima e do “manel Pereira” o sistema eram os PBX, assim como na fábrica de cimentos da Maceira e Pataias, sabe, eu fiz a pé por várias vezes o percurso entre S. Pedro e Água de Medeiros quando chovia, o restaurante Gato Preto tinha telefone com uma ligação a fios nus em cobre, com isoladores em postes de sete metros com muitos anos á beira da estrada, sempre que havia trovoada junto do mar o telefone do parque de campismo Batista estoirava, nunca identificamos o fenómeno.

Já me passou pela cabeça, que alguma vez estive em sua casa, para reparar o telefone.

Um abraço…

 
At 22 maio, 2007 22:00, Blogger vero said...

Olá meu querido amigo, desafio aceite!!! ;)
Mas acho k vou fugir à norma... hehe...
beijos mil***

 
At 23 maio, 2007 14:43, Blogger Rosa dos Ventos said...

Cruzei-me contigo na Dona-Redonda e decidi entrar ontem.
Acontece que o comentário não foi registado.
Esta é uma nova tentativa para te dizer que me diverti imenso com o Troncas!

 
At 23 maio, 2007 21:26, Blogger Maria said...

É verdade, nos últimos 40 anos a evolução foi enorme...
Lembro-me muito bem dos PBX e das telefonistas se "perderem" nas linhas e cavilhas que tinham que ser cuidadosamente escolhidas, senão havia troca de conversas...

 
At 24 maio, 2007 00:02, Blogger A. Jorge said...

Tenho 49 anos e por isso ainda me lembro de muita coisa que falaste. Apesar de hoje não "conseguir viver" sem telemóvel e sem net, ainda digo: que saudades!...

Um abraço

Jorge

http://vagabundices.wordpress.com/

 
At 08 janeiro, 2018 10:11, Blogger dobranoc said...

Artigo muito interessante. Estou a desenvolver um trabalho artístico inspirado nas telefonistas e este artigo veio mesmo a calhar :)
Elisabeth Nóbrega

 

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