19 outubro 2006

CAVALHEIRO E MENDIGO - MAS COM MUITA CLASSE

Talvez isto responda a algumas questões que já me foram colocadas.
Não sei se alguma vez vos disse, mas faço-o agora.
Não distingo as pessoas pela cor da pele, não distingo as pessoas pelas suas escolhas e convicções, tão pouco distingo as pessoas pelo seu estatuto social.
Admiro a bondade, a firmeza de carácter, a rectidão moral e o saber, quer este saber advenha dos conhecimentos adquiridos pelo estudo, quer do saber adquirido através de uma experiência de vida.
Sou pois “elitista” aprecio a nobreza, quer seja a nobreza de um honrado operário, de um humilde trabalhador, quer seja a nobreza de um cavalheiro.
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Estávamos em meados da década de cinquenta.
Se a memória me não falha, uma vez por semana, logo a seguir ao almoço batia-nos à porta um senhor.
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Como apareceu a primeira vez, não sei. O que vos posso dizer é que, durante alguns, poucos anos, esta cena se repetia quase todas as quintas feiras.
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Entrava pela porta da escada das traseiras do nosso prédio; até já o esperávamos com certa ansiedade.
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Idoso, com um porte de cavalheiro, subia lentamente a escada amparado a uma bengala. O seu fato coçado e os sapatos cambados, denotavam que tinha dificuldades de vida. Melhor dizendo, era de facto um mendigo, mas cujo porte denunciava ter ainda algum orgulho na sua pessoa.
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Quando chegava ao primeiro andar, nossa casa, batia á porta e pedia alguma coisa para comer. Era a nossa empregada que o atendia e lhe dizia para esperar.
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Sentava-se então nos degraus da escada, tirava o chapéu, equilibrava a bengala num canto e esperava em silêncio.
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Pouco tempo depois, a nossa empregada trazia-lhe um tabuleiro com uma tigela de sopa, colher, guardanapo e um pãozinho.
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Terminada a sopa, Maria recolhia o tabuleiro e voltava alguns minutos depois com um prato de mais qualquer coisa, que poderia ser carne ou peixe de acordo com o que havia disponível, eventualmente uma peça de fruta e uma pequena taça de vinho.
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Terminada a refeição, Maria recolhia o tabuleiro e fechava a porta.
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Chegava então o momento alto, pelo qual todos já esperávamos. O mendigo, tirava o pacote de tabaco, o livro de mortalhas e começava tranquilamente a enrolar o cigarro. Estranhando a demora, sem se levantar, pegava na bengala e dava duas ou três pancadinhas no vidro da porta.
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Dentro de casa, risada geral, saboreando já o desfecho da questão.
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Maria, abria a janela e perguntava:
- O que é que o senhor quer?
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Sem se perturbar o mendigo respondia com firmeza, textualmente isto:
- Então e o meu café?!...
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…e lá vinha o cafezito, pois então.
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Um dia, deixou de aparecer…
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8 Comments:

At 20 outubro, 2006 03:05, Anonymous Anónimo said...

Pois… Quando eu era gaiato, 8,9 anos, nos dias maiores eu brincava na rua com os outros, no aproximar da noite uns regressavam a casa e outros vinham para o jardim, junto ao cine-teatro, ora, eu chegava a casa dos patrões da minha mãezinha, já ela lavava a loiça do jantar, esta cena aconteceu inúmeras vezes, nada me dizia, a minha mãe, e eu fazia de conta que não era nada comigo, mesmo com fome.
Já noite, e por vezes longa, quando chegava a casa, comia umas sopas de café, e depois cama, que no outro dia havia escola.
As coisas aconteciam assim mas eu nunca fui pobre, vivia numa casa a candeeiro de petróleo, mas as minhas férias em Julho eram na Praia da Rocha, e todos os anos fazia férias no campo, em Matas do Louriçal, aqui os outros miúdos tratavam-me por menino da vila, andavam todos descalços e eu de sandálias, quando recordo estes tempos, tenho vontade de me atirar ao chão.
Ó menino da vila vamos aos pardais? Ó Besnico, bons tempos…
Um abraço…

 
At 20 outubro, 2006 11:29, Anonymous Anónimo said...

Vivendo sorrindo
vivendo cantando
e a minha vida
eu vou levando.
Vivo alegre
vivo a cantar
e assim vou vivendo
até cansar.
Viva sorrindo
viva cantando
e a poesia
vai acabando.
Desejo um feliz fim semana , bjos

 
At 20 outubro, 2006 13:04, Blogger susana said...

Agora nao tenho tempo, para ler este teu post, mas eu volto!Deitei-me tarde ontem, estou cá com uma ressaca!!!Só vim dizer que não estou chateada contigo, porque haveria de estar?Sou boa desportista!Logo que as pessoas brinquem sem exageros, ou nao sejam promíscuas, por mim tudo bem!
beijos velhote eheheheh(touché)

 
At 20 outubro, 2006 14:58, Blogger £ou¢o Ðe £Î§ßoa said...

Bem, são as horas que são e eu já vejo a dobrar!!??
É impressão minha ou tens dois post's iguais???
Bem, eu li este, espero não ter perdido nada em não ter lido o de baixo...

Num me baralhes....

Até outro instante mais são!

(Agora lembrei-me da minha amiga São... ai, ai...)

 
At 20 outubro, 2006 15:01, Blogger £ou¢o Ðe £Î§ßoa said...

Todas as pessoas tem um dia que deixam de aparecer, até nós um dia... resta-nos recordar e sermos recordados!

Gude uikende!
Até...

 
At 20 outubro, 2006 18:57, Blogger Flôr said...

Mas porque será que as recordações nos sabem sempre bem?...

Beijos

 
At 21 outubro, 2006 14:47, Blogger Papoila said...

O teu texto recordou-me a Palmira... a lavadeira lá de casa... uma vez por semana lá chegava a Palmira com a trouxa a cheirar a sol... e enquanto se fazia o rol ela contava histórias fantásticas de mouras encantadas e almas penadas do rio.
Gostei muito.
Beijo

 
At 21 outubro, 2006 15:09, Blogger PAULO SANTOS said...

camarada!!!
um abraço....
Este post lembra me tambem um mendigo que em tempos idos visitava minha casa!
Não era é tão requintado.....

quando no natal passar por aqui, desde já fica convidado para um café!

Paulo Santos

 

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