20 abril 2007

ATÈ BREVE

Minhas caras amigas e meus caros amigos.

VOU DE FÉRIAS

No próximo dia 20 de Abril vou de férias e só volto em 7 ou 8 de Maio.

Coisas há que necessitam de uma certa distanciação para melhor as podermos enxergar. Por esse motivo vou até St. Tropez, Nice , Cannes, Mónaco e San Remo.

Não vou estar presente no 25 de Abril, nem nas votações internas do CDS-PP no próximo dia 21. Tenho mesmo que me distanciar…
Quanto ao dia 1º de Maio, também não estarei presente, pois é o dia do trabalhador… e eu, que até ao dia 24 de Abril de 1974 tinha a fama de ser Comunista, eu que trabalhava por conta de outrem, perdi o estatuto de trabalhador logo no dia 25 e passei a ser um desempregado, “FAXXISTA”, Lacaio do Patronato, etc. só porque usava gravata e vivia numa casa em Carcavelos, que até nem era minha e tinha que pagar renda.
Carcavelos, Concelho de Cascais, terra dos “RICOS”.

Naquele tempo eu apanhava o comboio ás oito da manhã para ir trabalhar para Lisboa; o comboio vinha cheio de milhares de “RICOS excêntricos”, que tal como eu iam trabalhar para Lisboa.

Hoje sou livre, tenho casa própria, mais do que uma, já não vou para Lisboa e se for vou de automóvel, só não posso falar muito, como não podia por causa da PIDE. Hoje já não há PIDE, mas temos o quadro de excedentes, a lei da mobilidade, a avaliação, subjectiva feita pelos “lacaios do governo” que fecham serviços públicos e abrem instituições privadas que cobram pelo mesmo serviço o tripulo, mas que rende mais valias pessoais para os contratadores – Viva a Liberdade.

Ainda bem que veio a liberdade, hoje posso ser o que eu quiser, os “meus filhos” podem fumar charros e bater nos professores…
Neste momento o que eu quero é distância, por isso vou de férias.

Ainda bem que veio a liberdade, hoje sou livre, como sempre fui e por isso vou de férias. Mas vou triste, como sempre fui…

16 abril 2007

O SONHO DA PRIMEIRA BAILARINA

Dedico este conto a MARIA CARVALHOSA autora do blog “THORNLESSROSE” e a JÚLIA CALÇADA (pintora) pelos trabalhos apresentados no seu blog “JC”
Para compreenderem o sentido deste meu conto, leiam de Maria Carvalhosa o seu post “A quarta arte” e “The Shoow is Over” em referencia aos trabalhos de pintura de Júlia Calçada

APELO

Queridos amigos, como sou um idiota e não consigo “postar” comentários nos vossos blogs, resta-me esta solução para mostrar o meu apreço pelos vossos trabalhos.

A todos que me lerem, agradeço que façam chegar este conto e esta mensagem às duas supra citadas e talentosas bloguistas.
* * *
Hoje, depois do último aplauso, depois das luzes se apagarem, depois das portas do teatro encerrarem, depois do último autógrafo, depois do último ramo de flores, vou ter tempo para mim, pensou a bailarina quando finalmente os seus pés tocaram o chão.

Com passos humanos, atravessou a porta dos fundos, saiu para a rua, invisível, disfarçada no seu corpo humano, que não o da bailarina.

Não tomaria o caminho de casa. Não iria regressar a casa pelos caminhos da fama, não iria regressar para a solidão, não iria regressar para a sua cama vazia, preço da dedicação ao trabalho, à sua arte.

Desta vez partiria à descoberta de antigos caminhos, que já percorrera, quando ainda mal se equilibrava nas duas pernas, no seu andar desajeitado de menina que sonhava ser bailarina.

Atravessando as ruas da cidade, ofuscada pelos anúncios luminosos, pelas luzes vermelhas e verdes dos semáforos aos quais já nem prestava atenção, corria vertiginosamente em busca do sonho.

Aqui e além ainda viu a sua fotografia e um cartaz que anunciava a lotação esgotada do espectáculo de amanhã. Carregou a fundo no acelerador da viatura descapotável que conduzia, deixando entrar o ar morno da noite que lhe afagava o cabelo solto. Que bem lhe sabia sentir o cabelo solto…

Para traz ficava a cidade, ficava o público, ficavam os fotógrafos a imprensa, os contratos e os compromissos sociais. Na sua frente ficava a estrada, serpenteando em curvas apertadas ao longo da falésia escarpada do fundo da qual lhe chegava o som do mar.

Os faróis rasgavam a noite e mostravam-lhe o caminho da liberdade. Era possível, ainda havia tempo, talvez ainda houvesse tempo…

Seguia agora numa velocidade vertiginosa na esperança de ainda chegar a tempo.

Olhou para o lado, nervosamente procurou a maldita caixa dos comprimidos que não encontrava, precisava deles.

A estrada tornou-se subitamente mais suave, o carro parecia voar, sentia um silêncio e uma tranquilidade absoluta, como só os anjos podem experimentar.

Despertou da sonolência em que estava, a seu lado um braço forte de homem envolvia-a na ternura de um abraço, no rosto um beijo suave e uma mão de criança que lhe afagava o seio, um beijo do filho que nunca chegou a ter.


03 abril 2007

UMA BATALHA, UMA ERMIDA E UMA BILHA DE ÁGUA FRESCA

Não sou historiador, tão pouco sei alguma coisa de história que não seja já uma vaga recordação daquilo que aprendi nos bancos de escola.

A lenda que vos vou contar hoje, tal como a recordo da primeira vez que a ouvi, terá sido talvez o primeiro contacto que tive com a história de Portugal; teria eu então cerca de cinco ou seis anos. Ao contrário do que seria de esperar, foram-me estes episódios narrados por gente humilde, do lugar de São Jorge (Batalha) Distrito de Leiria.

Foram meus modestos “professores”, a senhora Júlia, mulher do senhor Luís, moleiros da azenha e a senhora Maria do Rosário, mulher de José Pedro, motorista de pesados de uma serração de madeiras, no lugar de S. Jorge. Já lá vão mais de cinquenta anos…

A senhora Maria do Rosário, cuja irmã servia em Lisboa em casa de minha Tia, foi para mim, desde sempre, como uma pessoa de família, mais uma avó, e segundo “reza a lenda” a primeira pessoa, depois das pessoas da casa, que pegou no Besnico ao colo, quando este ainda contava a modesta idade de seis meses.

Vivia a Maria do Rosário numa casinha modesta e acolhedora, à beira da E.N.1 e que no verão, acolhia durante alguns dias minha mãe, minha tia e claro está, o emplastro do Besnico.

A casa de Maria do Rosário, anos 50


Diziam então o Dr. França de Sousa, o Dr. Marques Pinto e o Dr. Mirabeau, (junta médica lá de casa só para “tratar” do Besnico) médicos da família e visitas de casa, que os ares do pinhal de São Jorge, faziam muito bem ao menino, o menino era eu claro; e assim depois de um mês de praia na Caparica, onde nos hospedávamos na Pensão Támar, pensão muito “chic” na época e onde igualmente se acomodava, entre outras figuras notáveis, o Poeta Silva Tavares. Assim, lá levavam o Besnico para S. Jorge, a fim de se recompor dos ares fortes dos mares da Caparica. (1945 -1950)

Da razão deste conceito cientifico dos ares do pinhal, não sei nada, mas o que desconfio é que as Senhoras da casa, uma vez determinadas a ir até casa da Maria do Rosário, local que muito apreciavam, achavam que deveriam fundamentar a decisão com um argumento de peso, corroborado pela profunda e indiscutível sabedoria dos senhores doutores, supra citados.

Assim sendo e a bem da saúde do Besnico, que até hoje teve sempre uma saúde de ferro, lá se iam passando os meses de verão “por ordem” dos senhores doutores; na Caparica, no Luso, em S. Martinho do Porto e claro está na casa da Maria do Rosário em S. Jorge. A praia seca da “Rosairota” como eu lhe chamava.

Perante estas justificações e fundamentações, não havia homem na família que se lhes opusesse. E quanto aos senhores doutores que aconselhavam estas “curas”… bem… vê-se mesmo que vocês não conheceram a minha mãe e a minha tia… mas havia lá algum médico no seu perfeito juízo que se atrevesse a fazer uma prescrição contrária à delas?!...

Parece que as estou a ouvir:

- O menino está fraquinho – sumo de laranja ao acordar, óleo de fígado de bacalhau no inverno e, na primavera para começar, duas ou três semanas no Hotel dos Banhos no Luso, rematando a conversa com este argumento de peso:

- Está decidido, já disse!

O tratamento aparentemente resultou, e embora já não tome o óleo de fígado de bacalhau, pelo menos por mera precaução ainda vou tomando o sumo de laranja e até aos vinte e oito anos, fui cumprindo com a medicação - Costa da Caparica, S. Martinho do Porto, apenas troquei o Luso por São Pedro de Moel, por ter uns ares mais fortes… (bolas, a medicina também evoluiu!…)

Mas não foi por isto que iniciei este conto. A razão deste palavreado todo tem apenas a ver com a história da Bilha de Água e a Ermida de São Jorge.


Tentarei ser fiel à narração que ouvi pela primeira vez, já lá vão mais de cinquenta anos, tempo em que as memórias do povo estavam mais vivas.

Vou contar a história, sem o rigor cientifico dos dias de hoje, onde pelo que leio e pelo que se escreve, principalmente nas páginas da “net”, quase que somos levados a concluir que a Batalha de Aljubarrota, a que alguém já chamou a batalha de “Alves Barrota”, não se tratou de uma luta entre Portugueses e Espanhóis, mas antes, entre Ingleses e Franceses, remetendo para segundo plano, como meros figurantes, os exércitos de Portugal e de Castela.

A minha descrição dos factos, pecará sem dúvida pela falta de rigor científico, mas estou em querer que tal como a ouvi contada pela boca do povo, ela será mais romântica e sem dúvida mais bela, geradora de um sentido de respeito próprio e de orgulho nacional.

Escutei-a repetidamente ao longo dos anos, primeiro sentado ao colo de minha mãe nas palavras modestas de Maria do Rosário, mais tarde nos bancos da escola, no discurso eloquente e empolgado do Sr. Lima, velho professor primário em Lisboa, dono do Externato Mestre de Aviz, homem austero, de pele escura, coração e cabelo branco e que nunca me traumatizou, nem mesmo pelas, algumas, reguadas que apanhei.

O Sr. Prof. Lima com os seus alunos (o Besnico estava lá - ano de 1952)


Este eterno espírito Português, que com uma mão castiga e com a outra dá o pão, quer seja o pão alimento do corpo, quer seja o pão alimento do espírito e do conhecimento.

Em ambos os casos escutei; de olhos arregalados de espanto e de boca aberta perante tamanha bravura. Soltando as inevitáveis gargalhadas, só de imaginar D.ª Brites de Almeida, a Padeira de Aljubarrota, a correr os Espanhóis com a pá do forno, tal como fazia Maria José, irmã de Maria do Rosário, com uma colher de pau atrás de mim e do meu primo, repelindo os frequentes assaltos que fazíamos à sua cozinha para roubar os pasteis de massa tenra acabadinhos de fazer.

Que falta faz nos dias de hoje, uma Padeira de Aljubarrota à frente das Forças Armadas. Que falta faz hoje um D. Afonso Henriques… um Mestre de Avis, ou uns quantos conjurados, que em Belém ou em São Bento, atirassem pela janela, os traidores do povo.

A BATALHA

Estávamos então a 14 de Agosto de 1385, o sol dardejava as costas dos soldados dos dois exércitos, o Português e o de Castela. Naquela tarde de Agosto o calor era insuportável. Acomodados no vale, à sombra do pinhal, estavam os Castelhanos. No planalto de S. Jorge ao sol sem qualquer protecção, D. Nuno Alvares Pereira chefe militar das hostes Portuguesas, dispunha os seus homens para o combate.

Foram cavadas trincheiras e dispostas as poucas peças de artilharia de que disponham, os chamados “trons” rudimentares canhões, que se vieram a tornar eficazes, não pelos estragos que poderiam causar, mas antes, pela surpresa causada ao inimigo.

A enorme desproporção de forças era favorável aos Castelhanos, cerca de um português para cada quinze castelhanos.

Mas até ao final do dia, quando a batalha teve início, o principal inimigo do nosso exército, foi a sede. Nas terras em volta, nem uma gota de água; a única fonte conhecida estava do lado dos Espanhóis.

- A bica de água férrea, no fundo do vale, junto ao ribeiro onde agora está a azenha do Tio Luís e que o menino conhece, acrescentou Maria do Rosário; certeza confirmada com assentimento de cabeça pela Tia Júlia que ainda há pouco lá tinha ido encher o cântaro de barro que transportava à cabeça… aqueles Espanhóis souberam-na fazer!...

- Ah mas não contaram com a coragem e esperteza dos nossos Portugueses, acrescentava minha mãe, pondo achas na fogueira.

Enrolando o cigarrito de onça e fazendo que sim com a cabeça, o Zé Pedro acrescentou:

- Ora então!.. aquela técnica do quadrado foi genial. Os Espanhóis para atacar tiveram que desmontar por causa das trincheiras que os nossos cavaram. Se assim não fosse, debaixo do fogo dos arqueiros e a saltar as paliçadas, teriam caído dos cavalos e sido trespassados pelas lanças da infantaria.

Mas o quadrado, essa não lembra o diabo! Sabendo que era inferior em número, quis desmoralizar os Espanhóis, dispondo as tropas em quadrado e o mesmo número de homens espalhados pelo terreno ocupavam um espaço maior dando a ideia de serem muitos. Depois foi fácil, como o centro do quadrado estava vazio, D. Nuno esperou a investida Castelhana, os homens da frente afastaram-se para deixar passar os inimigos e fecharam o cerco com os Espanhóis lá dentro a levar porrada. eh eh !

Ao cair da noite, estava tudo resolvido. No terreno jaziam mil portugueses e quatro mil espanhóis. Para não falar dos cinco mil prisioneiros castelhanos.
Mas não ficou por ai, acrescentou o Zé Pedro por entre uma baforada de fumo do cigarro e um copito de vinho, que veio mesmo a calhar naquele quente fim de tarde dum dia de folga de Agosto.

- Os espanhóis puseram-se em fuga para Castela, mas foram perseguidos até à fronteira; nessa fuga o povo tratou deles e deixaram pelo caminho mais cinco mil soldados mortos.

A Maria do Rosário que até então tinha estado calada para não interromper a brilhante dissertação do marido, respondendo a um comentário de minha Tia acrescentou:

- Espere... é aí que entra a Padeira de Aljubarrota!
A mulher percebeu que sete espanhóis estavam escondidos no forno do pão. Cheia de medo, pegou fogo a um monte de carqueja e vai de acender o forno. Com o fumo os espanhóis tiveram que saltar cá para fora, mas como a porta do forno é pequena tiveram que sair de gatas, um a um, e ela do lado de fora com a pá do forno ia dando conta deles.


A BILHA DE ÁGUA

A tarde ia caindo, o Zé Pedro ainda foi ao Serrano, lavar a goela com mais um copito, que tanta conversa tinha-o deixado seco. A senhora Júlia, abalou caminho a baixo direita à azenha, montada no burrico onde tinha transportado a farinha, exclamando:

- Ai que já são seis horas e ainda tenho que fazer o jantar para o meu homem!
Quando cá estão estas senhoras de Lisboa agente põe-se à conversa e o tempo passa sem se dar por isso.
Oh D.ª Ester, dê um copito da água férrea que eu trouxe para o menino, que ele é um pisco a comer e vai ver!

Na lenha já fumegava um pote de ferro onde coziam umas couvitas apanhadas na horta de Maria do Rosário. Não sei se seria sempre assim o jantar, mas quando estavam aquelas senhoras da cidade, não faltava nada naquela casa. Por isso naquela noite, o aroma da carne a cozer e dos enchidos perfumava toda a casa.

Enquanto o caldo cozia e antes que a noite caísse, o Besnico acompanhava a “Rosairota” que ia dar a erva aos coelhos e tratar do canídeo.

Cão e Besnico, dois cachorros a rebolar no chão e a lambuzarem-se um ao outro… seria esta a terapia que os doutores de Lisboa referiam que fazia bem ao menino ?!...

Do poço, com a picota, era içado o balde de madeira e enchiam-se as bilhas de barro, que repousavam na cantareira ao lado da bilha de água férrea que a Tia Júlia moleira, tinha trazido especialmente para o Besnico.

Depois do jantar, à luz mortiça de um candeeiro a petróleo, o Besnico adormecia, mas ainda a tempo de ouvir contar a História da Bilha de Água:

- …e foi assim. Diz que depois da batalha, D. Nuno Alvares Pereira não querendo que mais ninguém passasse a sede que ele e os seus soldados ali passaram naquela tarde de 14 de Agosto, mandou construir no local uma ermida - a ermida de São Jorge e que nela fosse colocada sempre, dia e noite, uma bilha de água fresca e um púcaro, para que os viajantes que por ali passassem, pudessem matar a sede.

A ermida de S. Jorge – Março de 2007

Pormenor da bilha de água – Março de 2007


O Besnico adormecia, sentia vagamente que o levantavam do chã e o deitavam naquela enorme cama de ferro, com atractivas maçanetas de latão brilhante, onde uma fresca e aromática enxerga de palha e folhas de milho o aguardavam para uma noite descansada a sonhar com cavaleiros medievais, lutas com dragões e lambuzadelas de cão.

A última vez que bebi água pelo pucarinho de barro da bilha da ermida de S. Jorge foi em Outubro de 1977 a quando do baptizado de meu filho que, em homenagem a D. Nuno Alvares Pereira, também se chama Nuno.

Fizemos questão de o baptizar nesta ermida, tendo sido o primeiro baptizado que lá se realizou.

Como a ermida à data não tinha pia baptismal, tivemos que pedir ao Senhor Bispo de Leiria, uma autorização especial para o efeito, e foi concedida.

Hoje, sei, que lá se realizam já muitos casamentos e baptizados.

Cumprindo a tradição, tal como a mim tinham feito; sentei meu filho no cavalo de S. Jorge, pois dizem que os rapazes que em criança lá se sentarem serão sempre bons rapazes.

Com ele resultou…

O cavalo de S. Jorge
(S. Jorge matando o dragão)