DOUTOR SALVE A MINHA QUERIDA MÃEZINHA, ou Histórias do Tio Zé
Dedico esta história à nossa querida amiga “ROSA DOS VENTOS” pelo comentário no meu anterior “post” e para mais uma vez a fazer rir.
À memória do Dr. “Tio Zé”.
Homem de fina graça, da antiga escola dos médicos de Coimbra, dedicou toda a sua vida, como médico de aldeia, ao povo da sua terra, num maravilhoso cantinho algures em Trás-os-Montes.
Tio de minha mulher, foi este homem pessoa importante na região como médico hidrologista, chegando a ser Delegado de Saúde na região.
Poeta e bom contador de histórias, fruto da sua vivencia de médico da aldeia, poderia ter escrito um livro o que todavia não fez, por motivo de adversidades várias, nos seus últimos anos de vida.
Foi a ele que eu roubei o título do meu blog, “MEMÓRIAS DE UM AMNÈSICO”.
Nunca gostei de plagiar ninguém, mas penso que contar com palavras minhas esta história verídica, tentando ser fiel à narração que de sua boca escutei, não poderá ser considerado plágio.
Para si, Tio, aqui fica a história, em jeito de homenagem, com a mais profunda saudade.
* * *
DOUTOR SALVE A MINHA QUERIDA MÃEZINHA
Uma noite, reunidos lá em casa à lareira, penso que em vésperas de Natal, bateu-nos à porta com estrondo, um homem que em grande agitação gritava:
- Ai doutor, por amor de Deus, salve a minha querida mãezinha!... Salve a minha querida mãezinha, que mãezinha há só uma!
Prontamente o médico saiu para a rua e deparou com um homem conhecido na aldeia pelas suas famosas e continuadas histórias de bebedeira. Na sua companhia uma velhota, sua mãe, que sangrava abundantemente de uma extensa ferida na arcada ciliar.
Sem mais delongas, o nosso Tio encaminhou a idosa senhora para o consultório que funcionava numa dependência da sua casa a fim de lhe prestar os cuidados mínimos e a encaminhar para o hospital. Tudo isto ao som da gritaria do bêbedo:
- Ai doutor, por amor de Deus, salve a minha querida mãezinha!... Salve a minha querida mãezinha, que mãezinha há só uma!
O que é que se teria passado?!...
A velhota preocupada com o filho que tardava em chegar; a despeito da geada que se fazia sentir, cobriu-se com um agasalho, meteu-se ao caminho e vai de percorrer todas as tabernas da aldeia à procura do malandro. Não tardou, pelo burburinho, que fosse dar com ele numa tasca onde já tinha iniciado uma forte briga.
Tomada de pânico a velhota interpõe-se, na tentativa de apartar os contendores pelo que, na confusão, recebeu um valente soco num olho.
Já no consultório, o nosso Tio observou a ferida, rodeou-se de todas as percussões e deu início aos curativos tendo concluído que não seria necessário enviar a velhota para o hospital.
Como médico do corpo de Bombeiros, estava habituado a estas situações de emergência e o caso não era nada que em condições piores, inúmeras vezes, não tivesse já feito.
Assim e considerando a extensão da ferida, decidiu ele mesmo suturar a velhota com um pontinho ou dois.
Preparou a injecção de anestesia e quando da primeira picada a velhota ter-se-á dorido e queixou-se. Foi então que, o extremoso filho, saltando do sofá onde estava a curtir a bebedeira, vociferou:
- Cale-se sua besta, você aqui não diz nada. Aqui quem fala é o senhor doutor!
Depois continuando com a berraria, acrescentou:
- Ai doutor, por amor de Deus salve a minha querida mãezinha!... Salve a minha querida mãezinha, que mãezinha há só uma!
Juro-vos meus queridos amigos, isto é rigorosamente verdade.