29 setembro 2006

CINEMA E UMA CHAVENA DE CHOCOLATE

Operador de cãomera
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Mais do que um conto é uma história verídica. Um grito de dor e desespero que espero venhas a escutar.
Já passou o tempo, inexoravelmente; não podemos voltar a trás. Mas se no teu sangue ainda correrem vestígios do sangue, desse exemplo de bondade e tolerância que foi teu pai, permite ao menos que se alguma culpa tenho, me seja concedido o direito de me explicar. Só assim poderei morrer em paz.
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Estava a passar em revista os meus velhos filmes de 8m/m. Imagens com trinta e cinco, quarenta anos.
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Tenho em mente a ideia tratar das imagens, preserva-las guardando-as em DVD, como recordação.
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Naquele tempo o cinema amador era mudo e o som colocado posteriormente; na falta do som original, que nunca coloquei, pensei valorizar as imagens adicionando-lhes uma adequada música de fundo, eventualmente incluir uma ou outra legenda ou até um comentário.
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Som original para quê?!... aquelas imagens falam por si…
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Nelas pude ver, meus pais, minha avó, meus tios, gentes e locais que o tempo apagou. Foi então que, meu Deus… já nem me lembrava; surgem na tela imagens dela e minhas… nós, com vinte e poucos anos de idade… bateu-me forte o coração, quase sufoquei… nem quando a vi pela primeira vez o meu coração bateu assim.
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Pelos meus "olhos" passaram imagens de um mundo que já não existe
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Ela era linda, ainda é linda. Ria, ria muito, era tão alegre… beijou-me; para a época um escândalo que ficou registado pela indiscreta câmara, e na frente dos pais e dos “futuros sogros”, acreditávamos…
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Depois, descendo a escadaria de sua casa, aparecem os pais dela.
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A mãe… bonita senhora, cujos cuidados com a filha eu só passei a entender quando também fui pai de uma rapariga.
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Depois o pai dela; esse grande senhor, cujo coração debilitado, pleno de bondade, era todavia suficientemente forte para albergar os amigos e os mais desfavorecidos da sorte, que dele se abeirassem ou que deles tivesse conhecimento.
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Tive o privilégio de o conhecer, concedeu-me a sua amizade e nas nossas truculentas discussões políticas, aprendi algo que haveria de marcar para sempre a minha maneira de ser – o valor da lealdade e da amizade.
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Naquele fatídico dia, ela perdeu o pai e eu perdi um amigo… um amigo a quem, sem o saber, falava pela derradeira vez… um amigo a quem dei a minha palavra… e Deus sabe que não pude - não me deixas-te cumprir…

Velha não, apenas antiga.

Mas por mim podes tomar conhecimento dum mundo que não conheceste.

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Na tela as imagens continuavam a passar; de má qualidade, desfocadas, não sei se pala antiguidade da película se pelo fumo do meu cigarro que me embaçava a vista.
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Agora eram os meus pais a entrar no carro e ela a conduzir. Já tenho visto mulheres a conduzir bem, mas como ela… era louca por automóveis.
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As imagens saltaram, desapareceram da tela. Na máquina a bobine rodava, rodava, fazendo aquele barulho de fita solta; tinha chegado ao fim.
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Durante largo tempo ali fiquei, apático, imóvel, perdido nos meus pensamentos, mergulhado em recordações…
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22 setembro 2006

QUADRILHA

Se a memória me não falha, gostaria de vos deixar aqui este poema de Carlos Drummond de Andrade "QUADRILHA"
Não conheço outro que tão bem defina o que se passa na vida - amores e desenganos...
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Penso igualmente que este poema responde cabalmente, à questão "matemática" levantada pela nossa amiga "Blogista" apc - no seu blog CAMUFLAGENS com o "poste" a que deu o nome de Conto de Contas.
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Fiquem pois com este poema que o saudoso actor declamador João Villaret, tão bem interpretou.
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poesia “Quadrilha” de Carlos Drummond de Andrade :


“João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J.Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história"
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My Fair Papoila

Papoila, querida amiga… ahh! O Manuel Maria já faleceu?!... coitado, e eu que nem sabia que ele estava doente!...
Então foi de repente!?...
Vou já telefonar ao Luís Vaz… sabe quem é?... aquele que é cego dum olho e escrevia versos para a D.ª Amália… para ele vai ser um choque, eram bons amigos. Vai chorar muita lágrima, com aquele olho que lhe resta.
Aproveito para lhe enviar; querida Papoila, um beijinho e os meus cumprimentos ao seu amigo Alemão.

Não querendo ser má língua, sempre lhe digo e porque sou seu amigo; consta que esse tal de Alzheimer anda com a minha vizinha do 5º esquerdo… não que eu tenha visto alguma coisa, mas … diz-se…
Olhe, na minha opinião mais vele um Amnésico na mão do que um Alzheimer a voar (que é como quem diz – a subir no elevador)
Queira pois receber os afetuosos cumprimentos daquele que, bom grado, se perderia nos vapores inebriantes do ópio, que apenas certas papoilas produzem.

(ai se a cannabis lê isto… então é que vai ser uma droga)

20 setembro 2006

DIREITOS DE AUTOR

Não sei a razão pela qual hoje ao acordar me lembrei deste soneto.
Ao que parece, foi escrito por um rapazito de carão moreno e meão de altura que se a memória me não atraiçoa, dava pelo nome de Manuel Maria Barbosa du Bocage. (a saber, dono de uma rua em Setúbal)

Como o “rapazito” não escrevia mal de todo, deixo-vos aqui com este soneto, não obstante pensar que seja um plágio de um soneto que eu escrevi, mas como não quero entravar a promissora carreira deste rapaz, vou deixar passar.
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Meu ser evaporei na lida insana
Do tropel de paixões, que me arrastava;
Ah! Cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
Em mim quase imortal a essência humana:
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De que inúmeros sóis a mente ufana
Existência falaz me não dourava!
Mas eis sucumbe a Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua orgia dana.
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Prazeres, sócios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si não coube,
No abismo vos sumiu dos desenganos:
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Deus, oh Deus!... Quando a morte à luz me roube
Ganhe um momento o que perderam anos,
Saiba morrer o que viver não soube.
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Manuel Maria Barbosa du Bocage

13 setembro 2006

Uma história de amor em São Pedro de Moel - Jornal de Leiria, 7 de Setembro de 2006

A MANSÃO DAS GAIVOTAS

José Cabrita Saraiva escreveu e Bruno Gaspar ilustrou.

Dois jovens de 27 anos, realizaram um trabalho que muito me enterneceu.
Não está tudo perdido, jovens como estes ainda me fazem acreditar no futuro.

Foi no passado dia 9 de Setembro que deambulando por ali à procura da minha identidade, não se esqueçam que sou amnésico, fui parar ao “Bambicafé” em São Pedro de Moel, foi então que alguém que não reconheci me disse – logo ás 18 horas vai cá estar para o lançamento do livro, não vai?... Respondi que sim, pois não sabia o que era o lançamento de um livro, acho que nunca tinha visto antes…

Abençoado dia e abençoado livro.

O dia, porque tive a felicidade de ver um rosto de mulher e uma casa, que julguei ter reconhecido, mas vá lá saber… se calhar é mais uma das minhas confusões. De qualquer modo, não sei porquê, senti-me muito feliz ao vela.

O livro, porque através dele pude usufruir de um momento de agradável leitura naquele tranquilo local.

Não percam, leiam a “A Mansão das Gaivotas” de José Cabrita Saraiva com ilustrações de Bruno Gaspar, que a Livraria Arquivo em boa hora editou e ficarão a saber da maravilhosa obra de que lhes estou a falar…

Aos autores, desejo muitas felicidades e aqui fica o sincero agradecimento deste velho… !?…!?... Amnésico.